“Lembro-me, com certo calafrio, de um dos cães do meu tio que pulava o muro com muita facilidade por causa do seu tamanho, um dog alemão chamado Tarzan. Era um cão muito grande, e perto de mim, uma criança à época, parecia um cão gigante “
Ou o Lote ou os Cães
Por Paulo Siuves
Eu nasci em Contagem, à época, uma cidade empoeirada e afetada pela fuligem da extinta fábrica de cimentos Itaú. Todas as casas dos bairros vizinhos à fábrica eram visitadas cotidianamente por aquela fuligem. Foi ali que eu nasci… Ali mesmo, no quarto da minha tia Nilce, adorável tia, linda, debaixo dos seus cabelos brancos refulge uma pele negra sem rugas até hoje, uma pele de seda.
Minha mãe era a mais velha da turma, um grupo de nove irmãos, infelizmente, nem todos estão entre nós, mas era uma família muito alegre e festeira, qualquer motivo era festa, nos casamentos então! Era festa pra uma semana, tipo famílias do interiorzão de Minas Gerais que mata boi e assa no buraco feito no chão. Peraí! Sem exageros (risos). Lá na casa da minha avó não tinha gado e nem espaço para criá-los. Era uma casa simples num lote do bairro JK, bem ali, no Eldorado, entre o que hoje é a estação de metro àgua Branca e o Shopping Itaú (lembram-se da fárica de cimentos que soltava uma matéria negra, pulverulenta?), mas, as festas eram “de arromba”, principalmente porque meu tio fazia parte de um conjunto musical formado por sete rapazes e quase todos eram da família, eram primos, tios, e alguns amigos muito chegados, sempre tinha música ao vivo do início da tarde até alta madrugada.
Meu tio músico é o caçula entre os irmãos da minha mãe. Ele sempre demonstrou muito carinho com animais domésticos e tinha cães e gatos; se não me falha a memória, eram quatro cães e dois gatos, alguns passarinhos nas gaiolas, coelhos num canto do quintal, etc. Porém, os cães eram as causas de alguns dos muitos problemas de minha saudosa avó.
Lembro-me, com certo calafrio, de um dos cães do meu tio que pulava o muro com muita facilidade por causa do seu tamanho, um dog alemão chamado Tarzan. Era um cão muito grande, e perto de mim, uma criança à época, parecia um cão gigante.
Certo era que os vizinhos ficavam incomodados com tamanha barulheira feito pelos cães de diversas raças. Tinha a Suzie, uma SRD amável e brincalhona. Tinha uma cachorrinha que ficava dentro de casa e tinha o latido mais agudo de todos, a chamávamos de Lili, essa era Pequinês, uma antiga raça de cão miniatura, originária da China.
O vizinho que mais se sentia incomodado com o barulho dos cães chamou meu tio numa certa noite de calor, deveria ser por volta de onze e meia da noite, e perguntou se ele queria comprar a casa dele. Muita conversa e explicações a cerca da casa, do lote, da construção de boa alvenaria, e muito mais coisas ditas. Até que meu tio mostrou-se constrangido e disse “não” à oferta de compra da tal casa. O vizinho não se deu por logrado; colocou a mão no ombro do meu tio e o olhou dentro dos olhos na intenção de transmitir a seriedade da contraproposta. Em meio aos latidos dos cães, ele se ofereceu para comprar os cães do meu tio.
Paulo Siuves é escritor, Formando da Universidade Federal de Minas Gerais, Presidente da Academia Mineira de Belas Artes, Embaixador Cultural da Academia de Letras do Brasil, Músico e Agente de Segurança Pública em Belo Horizonte, e escreve semanalmente para o Jornal Clarin Brasil