“Minas, são muitas, porém, poucos são aqueles que conhecem as mil faces das Gerais.”
Por Paulo Siuves – Jornal Clarín Brasil JCB News – Belo Horizonte em 30/12/2020 às 08hs05mins
Falando e Entendendo o Mineirês
Mineiro adora a letra “n”, né? Toda hora tem um trem com a letra adorada por quem nasce “ni” Minas. Tem “n” pra todo lado, desde algo “nu jeito”, ou muito bom, até uma nhaca ruim demais. Já houve tentativas de enumerar as expressões usadas em Minas para que o país inteiro soubesse da existência delas, porém, cada expressão é usada de maneira diferente em ocasiões diferentes. Exatamente como dizia o poeta João Guimarães Rosa, “Minas, são muitas. Porém, poucos são aqueles que conhecem as mil faces das Gerais.”
Temos muitas coisas em que podemos usar a letra ene, tipo o tal NECA, sabe o que significa neca? Em algumas ocasiões usamos o “neca de pitibiriba”, ou o plural necas. Significa uma negativa, ou nada, uma forma de dizer “de jeito nenhum”, ou “nada a receber”, uma negação de algo ou algum fato, por exemplo;
- O Galo deu um show ontem?
- Neca. Nem uma bola na trave.
- Ele deu alguma oferta na missa?
- Necas…
Em Minas ainda temos uma sequência de monossílabos que só quem mora aqui sabe o que significa. É o caso do “Né”, do “Nóóó” e do “Núúú”. Mas esse nú não soa do mesmo jeito da palavra sinônimo de desvestido, pelado, exposto, descoberto, sem roupas… Soa mais ou menos como a primeira sílaba da palavra nuggets, só que mais ou menos… Porque é uma expressão mineira, falada e compreendida aqui. Significa que algo muito espetacular aconteceu. Tipo quando dois carros passam por um triz de se abalroarem, a gente vê e diz com força diafragmática: Nnnú!! Se é algo que incorre em risco de morte iminente, a expressão é “Nnnússs” que pode ser traduzido por “Nossa Senhora”. Mas, não é toda hora que se usa “Nnnússs”, afinal, não se usa em vão o nome da Santa.
Temos o “nóóó”. Não existe aproximação idiomática para o “nó” de laço, união, vínculo ou trama, muito menos sinônimo da articulação das falanges dos dedos. Usamos a expressão “nóóó!” quando acontece algo fofo; quando um bebê faz algo inesperado e realmente fofo, dizemos ” Nóóó…”. Ou quando algo previsto acontece e a expressão poderia ser “eu sabia que isso iria acontecer” dizemos apenas “nóóó”. Tipo quando a Vilarinho enche na época de chuvas, ou quando o time perde no Mineirão, quando a vaca vai pro brejo, dizemos apenas isso: nóóó.
A expressão “né” poderia ser colocada no dicionário, pois é muito natural, né? Quer dizer, “não é?” É uma interrogação que usamos como amuleto no lugar de um advérbio revelando ocorrência de tempo, modo, lugar, qualidade, causa, intensidade, oposição, dúvida, aprovação, e outras coisas mais, até como expressão de afirmação ou negação. Basta dizer “né?” depois da frase do interlocutor e pronto. É uma expressão que se pode Xuxar em quase qualquer conversa. tal como, quando a gente está no ônibus lotado e quer pedir para alguém dar mais espaço, dizemos afirmando: “Arreda pra lá, Né?”. Não é uma pergunta, é uma sentença em modo imperativo afirmativo. “Afaste-se um pouco, por favor”. Ou quando o afago é bom, dizemos: “Arreda pra cá, né?”, “cola nimim, né?”. Outros exemplos;
- O churrasco estava muito bom.
- Né? – Quer dizer: “Estava mesmo, delicioso”.
- O churrasco estava muito ruim.
- Né? – Quer dizer: “Estava horrível”.
O nosso “né” pode ser usado em frases onde o modo imperativo é negativo também, como o caso da oração: “né nada não!”, “né desse jeito não”, “né fácil não”, entre outras formas corriqueiras. Contudo, ainda pode ser usado de modo a formular uma interrogação afirmativa, mais ou menos assim: “Né p’sivel, né?”
Ou seja, somos muito hospitaleiros e temos nossa culinária para melhor receber quem vier se aventurar por essas bandas de cá, mas, porém, todavia, contudo, entretanto, não obstante, tem que ser mineiro pra entender a hora de Xuxar essas expressões. Aliás! Sabe o que significa “Xuxar”? Significa enfiar, colocar, meter um trem em algum lugar. verbi gratia; quando as crianças vão em alguma festa, vão logo xuxando os doces nos bolsos para levar pra casa. Então, se você não for mineiro e não morou pras bandas de cá por pelo menos dez anos, não tente Xuxar esse tandi coisa nas conversas porque nosso idioma é único, é um trem que só nós sabemos falar e podemos entender facilmente.
Paulo Siuves é escritor, bacharelando em Estudos Literários pela Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, presidente da Academia Mineira de Belas Artes, Embaixador Cultural da Academia de Letras do Brasil, músico e agente de segurança pública em Belo Horizonte, e escreve semanalmente para o Jornal Clarín Brasil
Xuxar esta enxurrada de palavras para falar bonito.
Parabéns Paulo Siuves belo belíssimo texto maneirinho.