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PRESENTES TRANSFORMADOS,OU FUTUROS ROUBADOS – Por Angeli Rose

Dia desses uma amiga questionou-me sobre o fato de eu vibrar tanto com premiações a mulheres e ao destaque dado por algumas mídias às realizações femininas e corpos feminilizados

Por Angeli Rose/Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 12/02/2022

Os prêmios têm, entre outras funções, conferir representatividade social e sugerir que é possível para outras pessoas galgarem degraus que as levem a realizarem-se dentro das aspirações alimentadas. Os prêmios também inspiram e fomentam novos sonhos, alargando as visões daqueles que testemunham as conquistas e vitórias dos premiados: “ – Se ela conseguiu, eu também posso!”. Portanto, mais do que ser fogueira para vaidades, os prêmios dão esperança, reconhecimento e exemplos.

Em 1933, Carlota Pereira foi a primeira mulher eleita deputada federal por São Paulo, e seu mandato desenvolveu-se em defesa dos direitos da Mulher e das crianças. Nascida há 130 anos, a serem celebrados no próximo dia 13 de fevereiro, em São Paulo capital. Formou-se médica pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, era pedagoga também. Fundou a Academia Brasileira de Mulheres Médicas em 1950. Em Março de 1934 proferiu as seguintes palavras que compunham seu discurso na Assembleia Constituinte: “Além de representante feminina, única nesta Assembleia, sou, como todos os que aqui se encontram, uma brasileira, integrada nos destinos do seu país e identificada para sempre com os seus problemas (…). Não a muitos anos, o lar era a unidade produtora da sociedade. Tudo se fabricava ali: o açúcar, o azeite, a farinha, o pão, o tecido. [https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/biografias/carlota_pereira_de_queiros ]

Busto em homenagem a Carlota Pereira Queiroz, do escultor Luis Morrone [wikipedia]

E prossegue cônscia da Modernidade urbana que toma conta do país e manifesta de forma bastante lúcida o quanto a história das conquistas femininas andam par e passo com as mudanças do início do século XX, especialmente, na realidade brasileira : “(…) Mas, as condições de vida mudaram. As máquinas, a eletricidade, substituindo o trabalho do homem, deram novo aspecto à vida. As condições financeiras da família exigiram da mulher nova adaptação. Através do funcionalismo e da indústria, ela passou a colaborar na esfera econômica. E, o resultado dessa mudança, foi a necessidade que ela sentiu de uma educação mais completa. As moças passaram a estudar nas mesmas escolas que os rapazes, para obter as mesmas oportunidades na vida. E assim foi que ingressaram nas carreiras liberais. Essa nova situação despertou-lhes o interesse pelas questões políticas e administrativas, pelas questões sociais. O lugar que ocupo neste momento nada mais significa, portanto, do que  fruto dessa evolução.” [https://pt.wikipedia.org/wiki/Carlota_Pereira_de_Queir%C3%B3s]. Mas Carlota ,contraditória, apoiou a ditadura militar que fechou o Congresso, embora tenha lutado pela redemocratização do país no período do Estado Novo de Getúlio Vargas.

(1892 – 1982 ) ,Carlota Queiroz) 
1864 – 1984),Marie Curie

Nessa pequena galeria feminina de notáveis mulheres, Carlota fora precedida por Marie Curie que ganhou 2 prêmios Nobel (1911),o primeiro dividido com seu marido em Física e o segundo em química foi só seu. Mulher da ciência, discursou no recebimento de um dos prêmios; “(…) Há 15 anos, a radiação do Urânio vinha sendo descoberta por Henri Becquerel. Dois anos depois, o estudo desse fenômeno era estendido para outras substâncias, primeiramente por mim, e então por Pierre Curie e eu.”

Mas o que isto teria a ver com prêmios como comentado no início dessa prosa? Caro leitor, cara leitora, sem dúvida deu para notar tanto pelas breves notas bibliográficas, como pelos fragmentos de discursos, que tais destaques não são ainda suficientes para ampliar as condições de participação feminina na Ciência, ambiente tradicionalmente machista, como sabemos. Entretanto, é a divulgação ampla desses perfis que podem favorecer o ingresso de mulheres na Ciência e alimentar sonhos acalentados secretamente por meninas. Todavia, vale incrementar esse painel com observações sobre a cientista negra Sonia Guimaraes.(1957). Professora, Ph.D. em Física e primeira mulher negra a lecionar no ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica).

Sonia Guimaraes.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Sonia_Guimar%C3%A3es

Neste último 11 de fevereiro, a ONU celebrou o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, observando que apenas 1/3 da população ativa mundial é de mulheres investigadoras nas áreas das Ciências. O impacto disto, segundo o secretário da organização, é o impedimento para que meninas e mulheres possam contribuir para a inovação científica.

Dia desses uma amiga questionou-me sobre o fato de eu vibrar tanto com premiações a mulheres e ao destaque dado por algumas mídias às realizações femininas e corpos feminilizados, “como se iludir com tão pouco ante o muito que ainda é necessário acontecer para termos uma sociedade mais justa e igualitária do ponto de vista dos direitos das mulheres?” Se pensarmos que tão recentemente na história do voto feminino há apenas 100 anos temos esse direito conquistado, considero que estamos evoluindo, sim, no campo social dos direitos das mulheres e de suas participações nos diversos setores das sociedades.

Outra amiga contou-me que sua neta conquistara o primeiro lugar em diversos vestibulares para engenharia; outra ainda, comentou que sua neta entrou para medicina, moça negra que segue um caminho mais recentemente trilhado por outras mulheres negras.

Nesse sentido, a convocação-título do livro da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, Sejamos todos feministas (2014), é mais do que nunca imprescindível a compreensão de que fazer parte da luta pelos direitos das mulheres no mundo contemporâneo e do direito à educação plena para as meninas é lutar por direitos humanos. Ser um humanista hoje é alargar o sentido desse conceito e focar nos direitos das mulheres, na preparação de meninas através da educação e, sem esquecer, que a população negra também deve ser considerada em políticas públicas de direitos sociais.

 (Chimamanda Ngozi Adichie (Enugu, 15 de setembro de 1977)

https://pt.wikipedia.org/wiki/Chimamanda_Ngozi_Adichie

Do contrário, estaremos apostando, especificamente, no que diz respeito à sociedade brasileira em futuros roubados , sem nos darmos conta de que as infâncias de agora determinarão os futuros plenos ou não adiante. Por isso, vale ter atenção ao que Chimananda disse : “Eu estou com raiva. A construção de gênero do modo como funciona atualmente é gravemente injustiçada. Todos nós deveríamos estar com raiva. Esse sentimento, a raiva, é importante historicamente para as transformações sociais positivas, mas além de estar com raiva eu também estou esperançosa porque eu acredito profundamente na habilidade dos seres humanos de se reinventarem e se tornarem melhores (…)”.

Espero que nos reinventemos mesmo e logo para que meninas possam ter escolhas e não ficarem fadadas a uma educação de segunda classe ,ou a caminhos únicos.

Até a próxima!

Angeli Rose é PhD em Educação e Letras (UFRJ), Presidente do Instituto Internacional Cultura Em Movimento (IICEM); coordenadora do Coletivo Mulheres Artistas (CMA); Diretora de Eventos e Divulgação da AJEB; membro de associações e academias de Letras, Artes e Ciências. Autora de “Biografia Não Autorizada de Uma Mulher Pancada” e de Reflexões sobre experiências de leitura e algumas contribuições do mito de Don Juan; e Jornalismo Cultural: Um exercício de Valor; coautora de antologias nacionais e internacionais e colunista do JCB (digital). Fundadora do coletivo cultural ,teve a satisfação de vê-lo sendo premiado pela FEBACLA : Premio Destaque do Ano 2021,em reconhecimento de consagração pública, pela excelência e qualidade em sua atuação com destaque e credibilidade no cenário internacional. @angeliroseescritora

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