“Ouçam! Que lindo clangor, participem dessa algazarra, desse maldito escarcéu, dessa santa indecente balbúrdia, é preciso manter a agitação nas ruas!“
Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 15/01/23
Façam barulho. O som reinará. O império do Barulho já vai começar, não deixem o ruído cessar, provoquem uma sequência de estrondos, não parem de zoar. Suscitem vários estrépitos e que estejam em todas as esquinas de cada bairro, o silêncio será extinto das salas de reuniões e dos quartos de hospitais. Deixem soltas as crianças nos jardins e os adolescentes nas escolas, que façam o que sabem fazer, berrem, eles sabem berrar. O mercado inteiro em efervescente fragor e as fábricas produzam alto-falantes potentes para o batido de ostentação. Que aja rumores inexpressivos em todo canto, em toda música, que cada banda, e cada conjunto toque instrumentos percussivos reverberando sem preocupar com ritmos, cadências e compassos sonoros. Ouçam! Que lindo clangor, participem dessa algazarra, desse maldito escarcéu, dessa santa indecente balbúrdia, é preciso manter a agitação nas ruas. Venham para o meio do alvoroço.
O império do Barulho vai durar por cem anos e as crianças e os velhos dançarão ao som das tempestades ruidosas. O som será louvado na terra e no mar, nas festas dos jovens, as bombas de gás lacrimogêneo serão sucesso garantido. Nas avenidas, mancebos licenciosos avançarão desordenados, desorientados por decreto do tirânico Insurreto. Aparelhos de rádio e televisão transmitirão em todo o tempo a luta do monstro do abismo contra as duas testemunhas do apocalipse. Cidadãos do mundo inteiro olharão para os mortos e não deixarão que os mortos sejam sepultados. Crianças e adultos farão folguedos mascarados durante o velório mais longo que se tem notícia, juntos, durante o império do barulho, vão comemorar e mandar presentes uns aos outros. Ao fim do período de seu império, todos ouvirão uma voz forte, vinda do céu que lhes dirá: venham! Não parem de zoar.
Todos deverão ir para as janelas de seus apartamentos, soprarão em buzinas, baterão em panelas, e em tudo mais que se pode produzir som. Um século sob o governo do barulho. O reino estrondoso terá início. O verbo se fará ouvir, mas ninguém lhe dará audiências, todos podem falar ao mesmo tempo, não será mais sinônimo de indelicadeza nem se dará por inoportuno. O reino inteiro estará sob estrepitoso período. Que uns, façam tumulto, outros, façam tropel… Não parem a zoada, não parem o estrépito, não parem esse maldito escarcéu, não parem por nada. Quer seja dia ou noite, alcem toda e descontrolada vozearia. Por cem anos estaremos sob o Império do Barulho…
Paulo Siuves é escritor, bacharel em Estudos Literários pela Faculdade
de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, presidente da Academia
Mineira de Belas Artes, Embaixador Cultural da Academia de Letras do
Brasil, músico e agente de segurança pública em Belo Horizonte, e escreve
semanalmente para o Jornal Clarín Brasil