“A lá o sorveteiro!!!”

Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 09/05/25
O Apito da Tarde
Paulo Siuves
O sol já não queimava como antes. O vento passava manso pela janela. Tarde morna de meio de semana. O silêncio do verão mora nos becos da periferia. Só o ronco ao longe — talvez um carro. A hora esticada, como se o tempo coubesse dentro de um suspiro.
Eu, menino. Rua de terra. Antes do asfalto, antes do tempo. Grama rebelde no meio-fio. Pipas cruzavam o céu. Mas havia outro risco no ar: um som. Agudo. Breve. O apito.
O apito do sorveteiro.
— “A lá o sorveteiro!!!”
Corria descalço, a poeira no calcanhar. O som se aproximava. Um, dois, três assovios de metal. Era ele. A gente sabia. Sabia pelo som. Sabia pelo gosto: manga, coco, morango, limão. Sabia que ali começava a festa.
O apito era sinal. De alegria. De liberdade. De missão cumprida.
— “Corre lá, menino!”
A mãe no portão. O troco na mão suada. O som virando a esquina, levando com ele uma parte da nossa infância.
Mas ele voltava. O apito voltava. Sempre. Todo dia. Era trilha da rua, da vida. Música de criança. Das horas que não existiam. O apito chamava. E a gente ia.
Hoje não tem apito. Não aquele apito. Os carrinhos gritam com música alta. Sirenes. Sons demais. Mas não aquele.
O som.
O apito.
O tempo.
A rua mudou. Asfalto quente, carros demais, buzinas demais. Crianças de menos. Apitos de menos.
Só o silêncio por dentro. Grande. Vazio. E a lembrança daquele som.
Aquele apito arteiro que eu queria ter de volta.

Paulo Siuves é um dedicado defensor dos Direitos das Mulheres, reconhecido internacionalmente como “Embaixador da Paz” por seus esforços. Com um sólido histórico acadêmico e honrarias em Filosofia e Literatura, incluindo os títulos de Doutor Honoris Causa, Paulo apoia e promove talentosas escritoras, contribuindo para umcenário literário mais inclusivo e igualitário. Seu compromisso com a justiça social e aigualdade de gênero é evidenciado por suas inúmeras qualificações, incluindo cursos deformação em Direitos Humanos, e pelo reconhecimento com o Troféu Evita Perón, concedido pelo Núcleo de Letras e Artes de Buenos Aires.
As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Jornal Clarín Brasil – JCB News, sendo elas de inteira responsabilidade e posicionamento dos autores”
Delícia de crônica , saudades da infância , correr atrás do sorveteiro, mãe com o trocado ali pra alegria das crianças.
Parabéns amei cada detalhe, cada palavra que também me fez voltar lá pra quando era apenas uma menininha feliz .