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Quem mandou matar Marielle Franco? – Por Angeli Rose

Representar é irmanar forças e anseios, é amalgamar
sonhos para que novas realizações expandidas possam acontecer

Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 18/03/23


O assassinato de Marielle revelou como nosso
país é autoritário e avesso à democracia.
(Ministro dos Direitos Humanos,

Silvio Almeida,15/3/2023


Quanto tempo? Estava com saudades desse espaço e dessa interlocução no
JCB. Espero que o leitor e a leitora também tenham estado. Pois é,depois de
mais de 1 ano, voltamos a passear pelas palavras e pela coluna no final de
semana de vocês. Vida que segue…ou não…
Esta semana muitas manifestações em diferentes linguagens marcaram os 5
anos dos assassinatos de Marielle Franco, a vereadora carioca mais votada em
sua época(2016),e do seu motorista. O Coletivo Mulheres Artistas em 2021
realizou um Sarau virtual em homenagem a Marielle. Aliás, recordo que
dedicamos o mês de março a Mulher, com atividades diárias, entre debates,
palestras, rodas de conversas, lançamentos e recital poético. Nossa
mobilização fez escola entre muitas associações e academias de Letras e
Artes.

https://www.youtube.com/watch?v=-RB12HKrmoQ


A socióloga, mulher negra, lésbica, casada, com uma filha (Luyara),aos 38
anos,uma leonina com presas ferrenhas contra os machistas, milicianos,os
autoritários e os corruptos. Mas quis a passagem de Urano, o planeta da
intuição, mas também da distensão das energias do Universo que faz explodir
o que deve ser desafiado, não poupar Marielle Franco em 2018. Ele fez
explodir muitas balas sobre seu corpo forte, bonito, vigoroso que enfrentava o
poder das milícias e defendia a ideia da desmilitarização da polícia no Rio de
Janeiro e no país.

Manifestações legítimas e isso não é “mimi”, como os incrédulos querem em
alguns momentos fazer-nos acreditar,pois o assassinato de Marielle foi também
o assassinato de algo que a Democracia carrega, como é a potência da
representatividade. Representar é irmanar forças e anseios, é amalgamar
sonhos para que novas realizações expandidas possam acontecer.
Faz-se mister responder a esta pergunta emblemática: Quem mandou matar
Marielle? Por todas as mulheres que se lançam em oportunidades únicas em
que a sua singularidade é potencializada; e, também, pela Democracia que não
pode ser desafiada sem que o maior desafio seja estabelecido, o diálogo.
O assassinato de Marielle Franco foi uma tentativa cruel para fazer parar o
movimento de nossa sociedade com foco nos direitos civis e nas conquistas
sociais que, principalmente, as mulheres, mulheres negras e o movimento
LGBTIQ+ vêm alcançando, não sem muita luta. Por ter hoje a irmã, Anielle
Franco, fundadora do Instituto Marielle Franco, educadora, ex-desportista,como
Ministra de Estado,no caso, o Ministério da Igualdade Racial,tal iniciativa do
govern federal atual foi um tiro(de sniper) no autoritarismo que se permite fazer
o que fez: assassinar Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
A minha leitura do livro de Anielle Franco me comoveu e revelou tanto a beleza
de espírito de Marielle, como também a dor inimaginável que os pais, filha, irmã
e amigos, além de admiradores sentiram com a chocante notícia de seu
assassinato. O trecho da memória “Não pode ser” dá-nos bem a intensidade
incomensurável do desespero que se abate sobre aquela família num primeiro
momento, do corpo quente ainda da vereadora assassinada:


“Senti um choque; depois, muito frio.


Me lembrei de sua mão quente segurando a minha quando estava
parindo.Lembrei que você a segurava toda vez que eu era tomada pelo medo.
O sentimento de vê-la e não poder tocá-la me atravessou como faca amolada.”

Alguns passos por parte do atual governo federal foram dados, na direção de
desenrolar as investigações em torno do imbróglio que parece estar com o
caso parado, sem novidades. O Ministro da Justiça, Flávio Dino, incluiu a
Polícia Federal e tirou o protagonismo exclusivo da Polícia Civil, ao determinar
que um inquérito fosse aberto pela PF para investigar os assassinatos.
Entretanto, há que se fazer um esforço maior para se chegar à resposta
fundamental e fundadora da lógica excludente que prefere cortar a dialogar.
Talvez, porque soubesse que o diálogo tem mais a revelar do que
propriamente ajustar entre partes. Para ser mais clara, cabe dizer: quem sabe
pelas teses de Marielle Franco poderia se chegar aos mandantes? A quem
incomodava o ataque que a vereadora fazia à presença militar ostensiva nas
comunidades? A quem incomodava o olhar crítico sobre a milícia tão atuante
no Rio de Janeiro? Quem tinha laços com tais grupos? E se Marielle fosse de
fato candidatar-se a senadora pelo Rio de Janeiro, côo alguns políticos, aliados
ou não, comentavam, a quem mais incomodaria sua candidatura?
É provável que o enredo dessa trama sórdida seja mais consistente do que as
de Chicago P.D., ou Unidade Básica, quem sabe…Todavia, cabe registrar que
o tempo de uma investigação policial é muito diferente do tempo da dor de uma
família vitimada, ou da sociedade que tem sede de justiça ante crimes trágicos
como este.
Mas o fato é que os passarinhos andam cantando muito pouco nos ouvidos
atentos e sonhadores para contarem novidades que sejam pontes para se
chegar aos mandantes do bárbaro crime.
O desvio da munição (UZZ !8) que se destinava à Polícia Federal coloca em
suspeição também a PF, se pensarmos que o rastro de quem facilitou o desvio
e o efetivou já é em si uma condição para que anos mais tardes os

assassinatos se dessem.Se tal dado não servirá para elucidar o caso desse
assassinato, no mínimo, dá a ver a necessidade de maior controle sobre o
caminho que as munições compradas com dinheiro público do contribuinte
precisam ter.
“É preciso estar atento e forte!” e não permitir que tais ameaças à Democracia
continuem seu rio de lama. Em 8 de Janeiro não tivemos mortes,mas tivemos
naquele fatídico domingo fora do parque novo atentado contra a Democracia
brasileira, contra a legitimação e legitimada representatividade ,tanto de
Marielle Franco , como a de Lula como Presidente eleito do país. E não importa
se você, cidadão leitor, cidadã leitora, não gosta daquela mulher, não
acreditava em sua luta e naquela voz, porque do mesmo jeito que chegaram a
Marielle, ou á rampa do Planalto, podem chegar a quem desejarem. Por isso é
a Democracia que está em jogo, sem menosprezar a dor e a perda da mulher
sensível, mãe, militante, esposa, filha, amiga e acadêmica.
Assim, não há muito que falar neste momento a não ser insistir e continuar
perguntando? QUEM MANDOU MATAR MARIELLE FRANCO? E POR QUÊ?


De minha parte, manifesto minha tristeza e indignação com um poema escrito
em memória de Marielle Franco,publicado em “Pedras Deslizantes” (2022):

Canção do presente


À memória de Marielle Franco


Quando foi que os homens
acreditaram poder abusar
de suas mulheres?
Quem tramou empobrecer a
contação de histórias e de vidas?
Foi ele,ela,todos nós consentimos
sem meter tantas colheres,
omitindo palavras e feridas

Quando foi que alguém lhe disse
Que era atrevida e “não podia”?
Algum ser de fraca fabulação e
rala fantasia?Ou diversa sandice?

Quando quis falar e não conseguiu?
Deixou a ausência doída seguir
Com alguma faca ou tiro que lhe
atingiu?
Agora corre o manto de sangue
Por ruelas e vilas, cidades e
[avenidas
Buscam cidadãs e sentinelas da paz
que assustadas por guerras
[ indevidas

enfrentam duras criaturas com
[ madrigais
Assim como as perguntas se
[ sucedem
nossas sobrevidas se apoiam e
[ alcançam
numa corrente imaginária e infinita
certas de que virão a paz ,o amor
[maior entre os seres
e a delicada beleza da mão
[ estendida.

MARIELLE,PRESENTE!

ANGELI ROSE é professora, pesquisadora, carioca, mãe de Thiago Krause, tem vários
títulos honoríficos, atua intensamente no âmbito cultural, mas atualmente revê todas as conquistas, redimensiona as escolhas feitas e as parcerias estabelecidas, porque ao final e ao cabo, tudo pode escafeder-se em poucas horas, ou pela guerra mundial, ou pelo individualismo vigente que desmancha tudo o que parece sólido ainda.

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