Rússia e China querem expansão mais ampla para aumentar campo de influência, enquanto o Brasil defende entrada de novos membros de maneira mais lenta, segundo especialista
Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 18/08/23
O ingresso de novos países deve ser a principal pauta a ser discutida na XV Cúpula do Brics, marcada para acontecer entre os dias 22 e 24 de agosto na maior cidade sul-africana, Joanesburgo. O grupo de economias emergentes é formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Segundo o embaixador sul-africano no bloco, Anil Sooklal, mais de 40 nações manifestaram interesse em fazer parte do Brics.
Entretanto, os membros divergem sobre os critérios a serem seguidos para a admissão de outras nações. A China é a principal interessada na expansão do Brics para ampliar seu campo de influência em meio ao aumento das tensões com o seu principal adversário econômico, os Estados Unidos. Os dois maiores parceiros comerciais do Brasil travam uma guerra comercial há anos. Americanos e chineses disputam o primeiro lugar no ranking de maiores economias globais, hoje liderado pelos EUA.
No início do mês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu o ingresso de novos participantes no bloco. O mandatário brasileiro afirmou que a entrada da Argentina, Emirados Árabes e Arábia Saudita é “extremamente importante”. Mas o ex-secretário de Comércio Exterior e presidente do Instituto Brasileiro de Comércio Internacional e Investimentos, Welber Barral, explica que o Brasil defende uma ampliação mais lenta.
“No caso da expansão dos Brics ainda há um debate em vigor. Vários países manifestaram interesse em ingressar nos Brics e o Brasil tem defendido uma expansão lenta, iniciando com talvez Argentina, Arábia Saudita e Emirados Árabes, que são países com os quais o Brasil tem excelente relação e poderia apoiar alguns dos problemas indicados pelo Brasil no âmbito do Brics. Evidentemente, a China e outros querem uma expansão mais rápida até para incluir países que estão sob sua área de influência”, afirma.
Brics
Segundo o governo federal, o grupo representa mais de 3 bilhões de habitantes, que correspondem a 40% da população mundial; e US$ 25 trilhões em PIB, ou cerca de um quarto do PIB global. Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília Thiago Gehre, a participação do Brasil no Brics é muito importante para ampliar o volume de comércio brasileiro e diversificar a fonte de recursos externos para o país.
“O Brasil esteve, durante muito tempo, preso basicamente à influência do capital ou da Europa ou dos Estados Unidos. E o advento do Brics dá ao Brasil essa chance de recursos provenientes desses países também possam, de alguma forma, serem aproveitados para a construção da economia brasileira”, afirma Thiago Gehre.
O senador Irajá (PSD-TO) é presidente da Frente Parlamentar de Relacionamento com o Brics. Ele defende ampliar as relações entre os membros do bloco e acredita que a proximidade do Brasil com Rússia e China via Brics não prejudica o relacionamento com EUA e União Europeia, mesmo com as crescentes tensões entre as potências. O parlamentar destaca os ganhos que o país pode ter na agenda ambiental, por exemplo.
“São ações complementares e convergentes. O fato de você participar de um bloco como o Brics, de fortalecimento dessas nações, que já são nações amigas, que têm relações comerciais intensas. Isso não é excludente de poder aproximar o Brasil de outros blocos. Eu acho que nós podemos ter ganhos em várias áreas. E nós podemos ampliar isso, na medida em que tivermos mais projetos de investimentos de grupos desses países, essa posição do Brasil vai ampliar”, afirma o senador.
Histórico do Brics
Segundo o Ministério das Relações Exteriores (MRE), a coordenação entre Brasil, Rússia, Índia e China (Bric) iniciou–se informalmente em 2006, com reuniões entre os chanceleres em paralelo à Assembleia Geral das Nações Unidas. O bloco passou a ser um mecanismo de cooperação em áreas que tenham o potencial de gerar resultados concretos aos brasileiros e às populações dos demais países membros. Em 2009, na Rússia, foi realizada a primeira cúpula entre os chefes de Estado e de governo dos quatro países.
Somente em 2011 a África do Sul passou a fazer parte do grupo, quando foi acrescentado o S — South Africa — ao acrônimo. Já em 2013 o mais novo membro sediou a V Cúpula, em Durban. Dez anos depois, o país volta a receber os líderes do Brics, com exceção do presidente russo, Vladimir Putin, que deve enviar um representante devido a um mandado de prisão por supostos crimes de guerra emitido pelo Tribunal Penal Internacional.
Também em 2013, na Cúpula de Durban, foi criado o Conselho Empresarial do Brics (Cebrics), com o objetivo de assegurar que as principais prioridades do setor privado sejam efetivamente comunicadas aos líderes do governo no Brics durante a cúpula, como explica Welber Barral.
“O conselho empresarial dos Brics é composto por vários empresários relevantes que têm negócios em mais de um dos países dos Brics, então, é um mecanismo de diálogo entre líderes empresariais e os líderes políticos dos países componentes dos Brics”, explica.
No Brasil, a Confederação Nacional da Indústria é a secretária-executiva do Cebrics. De acordo com a CNI, a estrutura do mecanismo é formada por nove grupos de trabalho que contam com mais de 90 representantes brasileiros, que têm como objetivo a formulação de recomendações por temas.
Dez prioridades em discussão pelo setor privado, segundo a CNI:
- Estabelecimento de acordo multilateral de serviços aéreos, considerando que os acordos bilaterais que já existem são restritivos para o transporte aéreo;
- Colaboração para o desenvolvimento de fertilizantes inteligentes, biofertilizantes e fertilizantes minerais, e de padrões para certificação de fertilizantes ecoeficientes;
- Desenvolvimento de padrões para 50 qualificações futuras, permitindo unificar critérios para competições internacionais e programas de treinamento entre os países;
- Criação de um fundo para financiar projetos de energia limpa no Novo Banco de Desenvolvimento (NDB);
- Cooperação para o desenvolvimento de infraestrutura digital que aumente a conectividade, inclusive em áreas remotas dos países do Brics;
- Desenvolvimento de programas de competências digitais para meninas e mulheres;
- Elaboração de carteira de projetos prioritários de infraestrutura nos países do Brics para aumentar a visibilidade de financiamento;
- Desenvolvimento de rotas comerciais com investimentos em portos de pequeno porte, ferrovias e transporte marítimo de curta distância, para diminuir a pegada de carbono;
- Criação de plataforma de colaboração entre governo, setor privado e academia para buscar soluções para novos problemas de infraestrutura;
- Harmonização de padrões de regulação para produtos manufaturados, para facilitar a incorporação nas cadeias de valor.
Fonte: Brasil 61