A presença da mídia russa no continente ajudará a combater o domínio da mídia ocidental

Jornal Clarín Brasil JCB News – Brasil 18/04/25
Em uma ação vista como parte de sua ampla iniciativa diplomática pelo continente, a agência de notícias russa Sputnik abriu seu primeiro centro editorial africano em Adis Abeba, capital da Etiópia.
Analistas de política externa dizem que o lançamento ressalta o crescente interesse de Moscou em aprofundar seu envolvimento com a África, tanto diplomaticamente quanto na área da mídia.
Boniface Muoka, presidente do Departamento de Segurança, Diplomacia e Estudos da Paz da Universidade Kenyatta em Nairóbi, acredita que não se trata apenas de afirmar a presença política da Rússia, mas também de reformular a forma como a África é retratada, tanto no continente quanto globalmente.
Espera-se que o centro editorial sirva como um centro de cobertura regional, oferecendo uma alternativa às perspectivas da mídia dominada pelo Ocidente.
“Durante décadas, a cobertura da mídia sobre a África, de propriedade e controlada pelo Ocidente, tem sido distorcida, tendenciosa e injusta. A narrativa negativa sobre a África tem dominado a mídia ocidental, e a entrada da Rússia nesse espaço provavelmente mudará a situação e nos mostrará o outro lado do continente”, disse Muoka à RT.
Muoka acrescenta que, como a Rússia não está interessada em “policiar a África”, seu investimento na mídia provavelmente se concentrará em fortalecer seu relacionamento com o continente, contando a história positiva da África.
“Por meio da Sputnik, temos mais chances de testemunhar uma história de boas ações tanto da África quanto da Rússia, e não as histórias habituais de fome, corrupção, conflito, pobreza e subdesenvolvimento que têm sido uma norma na mídia ocidental”, acrescenta Muoka.
O centro editorial da Sputnik na Etiópia é o primeiro centro de mídia multifuncional de grande escala da Rússia na África.
“Mostrar o potencial e os marcos do continente”
Muoka explica que a decisão de estabelecer o centro editorial na capital diplomática da África demonstra a intenção da Rússia de consolidar sua presença e influência na mídia no continente.
“Para alcançar todo o continente e conquistar as almas das massas africanas, a Rússia tem todos os motivos para fazer tais investimentos na mídia porque precisa de uma voz que possa contar e vender sua história”, disse Muoka à RT.
A Dra. Jacinta Maweu, especialista em ética da mídia e políticas de comunicação do Centro Global de Política e Estratégia (GLOCEPS), observa que a Rússia precisa de uma forte influência e presença na mídia global para promover suas estratégias diplomáticas, econômicas e militares.
“A inauguração do centro de mídia foi oportuna e muito estratégica porque a Rússia fez enormes investimentos na África e precisa de uma ferramenta para ampliar isso”, disse Maweu à RT.
De acordo com Maweu, o investimento da mídia russa na África ajudará a neutralizar a imagem negativa do continente, que há muito tempo é pintada pela mídia ocidental.

“A cobertura da Rússia sobre a África não se concentrará no que não está sendo feito ou no que falhou, mas no que foi alcançado e nos esforços que estão sendo feitos. Isso ajudará a destacar o potencial e os marcos do continente”, disse ela.
“O domínio da mídia anti-ocidental”
Alfred Otieno, jornalista independente de Nairóbi, especializado em reportagens diplomáticas, argumenta que a entrada da mídia russa na África oferece aos jornalistas africanos uma oportunidade de contar a história africana de forma positiva, com uma voz africana.
“A forte presença da mídia russa no continente ajudará a combater o domínio da mídia ocidental na cobertura de assuntos africanos”, diz Otieno.
Falando durante a cerimônia de abertura do escritório da Sputnik em Adis Abeba, Valentina Matvienko , presidente do Conselho da Federação Russa, reconheceu que a Rússia e a África têm tido falta de interação de informações, uma lacuna que o investimento de mídia de Moscou na África busca preencher.
“Estamos dando um passo gigantesco em direção ao surgimento de uma ampla interação russo-africana. Em primeiro lugar, é claro, a interação informacional, da qual temos sentido muita falta e que agora é crucial para a formação de uma ordem mundial multipolar verdadeiramente justa, na qual os interesses dos países africanos sejam plenamente levados em consideração”, disse Matvienko.
A Sputnik, que é membro da União Africana de Radiodifusão, já opera estações de rádio em vários países africanos, incluindo Nigéria, Camarões, Níger, Mali, Guiné, Botsuana e Zâmbia. As estações de rádio transmitem programas em inglês e francês.
De acordo com Dmitry Kiselev, diretor geral do grupo de mídia Rossiya Segodnya, que administra a Sputnik, também há planos para abrir outros centros editoriais da Sputnik na África do Sul e na Tanzânia.
Muoka, no entanto, alerta que, mesmo que a Rússia expanda sua presença na mídia na África, uma medida que ajudará a equilibrar as narrativas, o continente deve estar atento à potencial formação das percepções públicas por meio da propaganda liderada pela mídia.
“O investimento da mídia russa na África deve se concentrar exclusivamente em mostrar soluções africanas para problemas africanos e não em uma ferramenta de divisão e propaganda”, diz Muoka.
Jacinta Maweu, por outro lado, observa que a Rússia não permitirá que sua mídia seja usada para propagar narrativas negativas contra o continente.
“A Rússia está se apresentando como amiga do continente e anti-imperialista, algo que a tornará querida pela liderança africana emergente e conquistará a confiança tão necessária que a mídia russa precisa do povo africano”, disse Muoka à RT.
Por Jackson Okata , um premiado jornalista independente baseado em Nairóbi, Quênia, cujo trabalho foi publicado pela CNN, The Guardian, Reuters, China Dialogue, Openly, AllAfrica, Mongabay, Inter Press Service, Zenger News e Al Jazeera English